A PANDEMIA E A BUSCA PELO CONSUMO DE MEDICAMENTOS: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Por Marcos Dantas*
O primeiro caso da covid-19 foi confirmado no Brasil em 26 de fevereiro de 2020 e daquele dia até hoje muitos de nossos hábitos precisaram ser readequados. Distanciamento social, lavar as mãos, usar o álcool em gel, o uso de máscaras e em alguns casos de luvas passou a fazer parte de nosso cotidiano alterando a vida das pessoas de forma contundente.
De fato, em Itabuna não foi diferente e em março de 2020 o comércio precisou fechar as portas por determinação das autoridades exceto os estabelecimentos considerados serviços essenciais, dentre esses serviços as farmácias.
Polivitamínicos, álcool em gel e máscaras tornaram-se os produtos mais procurados quando naquele momento as autoridades de saúde não descobriam um medicamento que pudesse ser eficaz na prevenção ou tratamento. Até que impulsionado pelo governo o chamado “kit covid” foi lançado sem nenhuma comprovação científica.
Incluindo um medicamento para combater malária e dores reumáticas e dois vermífugos as farmácias conseguiram impulsionar suas vendas aliadas a vitaminas para imunidade. É interessante salientar que em julho de 2020 a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) determinou que esses medicamentos precisavam de receituários médicos para serem dispensados à população.
Atrás do balcão da farmácia observei a crescente procura por ansiolíticos e pelos medicamentos do tal “kit covid”, medicamentos esses que precisam de prescrições médicas e cadastro da compra no sistema nacional da Anvisa. Passei por várias situações constrangedoras nas quais algumas pessoas de certa influência na cidade tentavam a todo custo me convencer a dispensar esses medicamentos através do “jeitinho”, do “sou amigo(a) de fulano(a)” e nos casos mais bizarros no “sabe com quem você está falando”?
Exerço essa profissão há 15 anos e nesse período eu nunca tinha presenciado essa corrida insana por produtos que antes não tinham tanta importância para a vida da maior parte da população. A cada negativa para a venda sem a prescrição, eu percebia como as pessoas se frustravam e se desesperavam. Ficava então me perguntando como elas acreditavam que um medicamento que não tem eficácia comprovada pudesse evitar o contágio ou tratar as pessoas infectadas. O aumento de prescrições de ansiolíticos seja natural, de tarja vermelha ou preta é perceptível e imagino que pode estar relacionado a fatores como o desemprego, a queda das rendas familiares e a própria preocupação com o vírus.
Em janeiro de 2021 tenho observado que nas prescrições médicas tem surgido medicamentos de tecnologia mais avançada e mais caros, sobretudo antibióticos, e tenho me preocupado por perceber que nessa mudança aqueles medicamentos de ação antibacteriana prescritos anteriormente, não tem sido prescritos de forma frequente como outrora.
Certo mesmo é saber que a profissão de atendente de farmácia precisa ser levada com a arte de dialogar, do servir os(as) pacientes que estão ali necessitando das medicações, saber lidar com a pressão da excelência e do dever de não errar e como todas as outras profissões, obedecer a regras e leis impostas pelos órgãos regulatórios.
*Marcos Dantas Estudante de Ciências Sociais na UESC Atendente de Farmácia
Muito bom o texto Marcos Dantas. Relatos como esse demonstram a grande relevância e valorização que nós profissionais de farmácia deveríamos ter dos patrões e da própria sociedade. Não apenas como mero balconistas e funcionários apenas do comércio, mas como um farmacista que exerce uma profissão que ao meu entender é uma extensão de clínicas e hospitais complementando o trabalho de vários profissionais de saúde. Nesse momento as autoridades também deveriam olhar par nós e entender que também fazemos parte do grupo de risco, e que também deveriamos ser prioritário para a vacinação, pois atendemos diversos pacientes que saem contaminados desses estabelecimentos, comprometendo nossa saúde e de nossos familiares.