Em 01 de outubro de 2010, o jornal Brazilian Times Newspaper, semanário que circula na região da Nova Inglaterra, trouxe matéria noticiada pelo The Boston Globe, jornal de maior distribuição na região nordeste dos EUA, sobre o caso do brasileiro Marcelo Alves, que estava internado no Massachussetts General Hospital, aguardando por um transplante de coração.
Aos 34 anos e pai de dois filhos, Alves sofria de cardiomiopatia, um enfraquecimento do coração, e a família tentava arrecadar dinheiro para custear o transplante. Ele foi diagnosticado em 2002, mas só em 2008 o médico que o atendeu no Beth Israel Deaconess Medical Center, hospital escola da Harvard Medical School, o informou que seu status imigratório, ele era indocumentado, era um problema nos trâmites até chegar ao transplante.
As autoridades federais dizem que é legal os imigrantes indocumentados receberem doação de órgãos, pois a rede que mantém o controle sobre as doações, aceita que pessoas, não residentes legalmente, possam fazer parte do sistema. Segundo Joel Newman, da United Network for Organ Sharing, da Virgínia, organização que gerencia as alocações de órgãos em âmbito nacional, “seria uma hipocrisia aceitar apenas os cidadãos americanos como candidatos”. Mais de 90% dos receptores de órgãos são americanos.
Não existe um sistema de saúde público universal nos EUA, mas existem algumas associações beneficentes que amparam o cidadão que não tem plano de saúde privado, com assistência médica e odontológica, dentre elas a Joseph M. Smith Community Health Center, em Waltham e em Allston-Brighton, Massachussetts, excluindo-se os procedimentos de alta complexidade.
Essa foi a primeira batalha para Marcelo Alves conseguir o transplante, a segunda era a questão financeira. Segundo a United Network for Organ Sharing, uma cirurgia de transplante de coração, incluindo os custos necessários das drogas antirrejeição, somente no primeiro ano, custavam $ 787 mil dólares, chegando a quase 900 mil dólares, até no segundo ano. Essa estimativa foi feita em 2010, hoje ultrapassaria 1 milhão de dólares. Parte das informações sobre o caso de Marcelo Alves foram extraídas de reportagem do Brazilian Times Newspaper.
Mestre Moa do Katendê, foi a primeira vítima fatal resultante de discussão política, durante das eleições do 2018. Morte custo zero. Entre 2018 e 2020, 76 pessoas foram mortas por motivações políticas.
19 de novembro de 2020. João Alberto Silveira de Freitas foi morto, também por espancamento, no Carrefour de Porto Alegre, após desentendimentos com os seguranças do local. 6 pessoas foram denunciadas pelo MP por homicídio triplamente qualificado, por motivo torpe, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima. Um ano após o assassinato de Freitas, duas pessoas estão presas.
Início de fevereiro de 2022. Durval Teófilo Filho voltava pra casa após um dia de trabalho e, próximo à entrada do condomínio onde morava, foi alvejado pelo sargento da Marinha Aurélio Alves Bezerra. Foi confundido com um assaltante. Antigamente tinha um ditado que dizia: atira-se primeiro, depois pergunta-se quem é. Hoje, com 3 tiros, acerta-se o alvo, sem nenhuma dúvida, nem a necessidade de perguntar de quem se trata. Como se justifica alguém que, sendo militar, é treinado e autorizado a portar arma de fogo, atira sem ter certeza se o alvo oferece risco?
Em abril de 2019, o músico Evaldo Rosa passava por uma rua próxima à favela do Muquiço, em Guadalupe, Rio de Janeiro, quando seu carro foi atingido por tiros, numa operação controversa do Exército. Uma pessoa que passava pelo local, e foi socorrer Evaldo, também foi atingida pelos projéteis. 62 tiros desferidos, mas, de quem se tratava, não tinha a mínima importância.
Há 4 anos, em Itabuna, cidade do sul da Bahia, um rapaz, nascido de família honrada e trabalhadora, entregava água aos clientes da empresa que trabalhava. Foi confundido por traficantes, brutalmente agredido e assassinado a pedradas.
Em 25 de fevereiro de 2018, Paulo Menezes dos Santos, Paulinho Garçom, como era conhecido na cidade, foi vítima de latrocínio – roubo seguido de morte. O ex prestador de serviços da Câmara Municipal de Itabuna recebeu naquele dia as verbas rescisórias provenientes de uma rescisão de contrato de trabalho, no valor de R$ 4 mil reais. O dinheiro estava com ele na mochila. Os autores do crime o conheciam, sabiam do dinheiro, o conduziram a um local às margens da BR 415 e executaram o plano. Foi esfaqueado várias vezes.
Recentemente, imigrante congolês Moïse Kabagambe foi espancado até a morte, num quiosque, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, em 24 de janeiro de 2022. O motivo foi a cobrança de R$ 200,00 por serviços prestados ao estabelecimento.
Fiz algumas pesquisas e também entrei em contato com o Brazilian Times Newspaper para saber o que aconteceu com Marcelo Alves, não obtendo resposta. Sobre Mestre Moa, Moïse, João Alberto, Durval, Evaldo… e tantos outros desconhecidos, esses sabemos o destino. Mortos, às vezes por motivo frívolo, alguns, vítimas de balas perdidas. Um projétil que tinha um endereço e foi parar em outro.
Num país que foi o último a abolir a escravidão e a última grande nação a adotar o sufrágio universal, não podemos perder a esperança de um dia, também eliminaremos essa barbárie sem limites. Banalizamos a vida, normalizando a violência. AFINAL, QUANTO VALE UMA VIDA? Não se sabe, mas pode alternar entre uma discussão de bar ou 1 milhão de dólares.
Leonardo Boff, no prefácio do livro Travessia, de Eduardo Moreira, fala sobre uma promessa e uma profecia. “A promessa de que nem tudo está perdido, de que podemos mudar o mundo, fazê-lo ser melhor ou menos perverso. Basta auscultar nossa própria humanidade, aquilo que está presente, mas recolhido em nossa existência: o amor, a solidariedade e o cuidado. A profecia de um mundo que vai chegar. Não porque queremos ou não queremos. Seremos forçados a isso. Chegará um momento do estado da Terra em que se apresentará uma alternativa: ou mudamos, ou não teremos futuro.”