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ELITES E INSTITUIÇÕES POLÍTICAS – A VOLATILIDADE ELEITORAL NO MUNICÍPIO DE ITABUNA – BAHIA

Por Cássio Varjão*

O objeto desse trabalho tem o propósito para discorrer sobre a Volatilidade Eleitoral para os cargos do legislativo da cidade de Itabuna/BA, entre 2012 e 2020, três eleições e dois períodos. A metodologia utilizada foi a pesquisa fundamentada num estudo historiográfico/analítico, procurando identificar o comportamento eleitoral da população. Assim, pesquisamos dentro dos estudos das elites políticas, da opinião pública e comportamento político, a motivação para esse alto índice de renovação do legislativo municipal. Nossa investigação tem o propósito de traçar o perfil dos novos vereadores e a que grupo pertencem; analisar a que classe social, gênero, etnia ou graus de instrução pertencem e avaliar a existência de uma nova elite política na cidade.

Por se tratar de um artigo científico, constituído por 14 laudas, nesse texto farei uma compilação do projeto original, que terá o intuito de apresentar com bastante clareza, os dados efetivamente pesquisados sobre o assunto em epígrafe. Essa investigação foi orientada pelo Prof. Dr. Carlos Alberto Simioni.

VOLATILIDADE ELEITORAL

Volatilidade é um termo constantemente utilizado na área econômica para designar a variação de um ativo, ou seja, tudo que tem valor e pode ser negociado no mercado financeiro. No contexto da volatilidade eleitoral, esta mede o grau de mudança do voto entre duas eleições consecutivas. Segundo Arquer (2015), “nos pequenos e médios municípios a taxa de volatilidade é mais alta e entre municípios grandes e capitais taxa de volatilidade é menor “. Para a autora “quando analisada por regiões, Sul e Sudeste têm menores taxas, e o Norte, Nordeste e Centro-oeste com maiores taxas de volatilidade”.

Por ter caráter multidimensional, envolvendo vários fatores, o voto é influenciado pelo contexto social e político, onde se vive e como vive, quais os grupos a que fazem parte, quais são as atitudes e o comportamento do eleitor. Nessa abordagem, verificaremos por que o processo de continuidade do mandato é interrompido na eleição seguinte e, nesse contexto, utilizaremos as características sociodemográficas, institucionais e econômicas do eleitor, para termos condições de nos aproximarmos da real situação de uma população que convive num ambiente eleitoral permeado por ofertas e demandas. Para Emerson Urizzi Cervi (2012): “quando as bases sociais não apresentam estruturas de fidelidades partidárias, consistentemente formadas, há um padrão de volatilidade eleitoral que se sobrepõe a cada eleição”.

ELITES POLÍTICAS

Nessa conjuntura, é necessário iniciarmos nossas argumentações discorrendo sobre um dos temas mais importantes na Ciência Política, que é o estudo das elites políticas. O berço dos conhecimentos sobre a teoria das elites políticas é a Europa Ocidental e teve como pais dessa importante área da Ciência Política os italianos Gaetano Mosca e Vilfredo Pareto e o alemão Robert Michels, que escreveram suas obras entre o final do século XIX e o início do século XX, período de grande efervescência social e política, quando as classes mais baixas da população passaram a ter participação política.

No Brasil, os estudos das elites são divididos em duas partes. Primeiro, na década de 1970, foram examinados os grupos predominantes durante o Império. A segunda parte, que foi desenvolvida a partir do final dos anos 1990, estudou os parlamentares brasileiros em momentos diferentes após a 2ª Guerra Mundial. Um dos maiores trabalhos sobre esse assunto é A Construção da Ordem: a elite política imperial, de José Murilo de Carvalho. Na pesquisa, a elite imperial se divide em três grupos: os ministros, os conselheiros de estado e os senadores. Segundo Carvalho (1996), apud PERISSINOTTO; COSTA; MASSIMO (2012, p 208), “durante os 67 anos que durou o Império, elegeram-se 235 senadores, foram nomeados 219 ministros e 72 conselheiros. De um total de 526 cargos, somente 342 pessoas ocuparam esses postos”.

OPINIÃO PÚBLICA E COMPORTAMENTO POLÍTICO

Os primeiros estudos sociológicos sobre o comportamento eleitoral foram iniciados na década de 1930, sobretudo na Universidade de Colúmbia, e o principal objetivo foi identificar padrões de distribuição de votos. Nos anos 1970, Gláucio Ari Soares usa seu livro Sociedade e Política no Brasil (1973) para explicar o comportamento eleitoral a partir de indicadores econômicos e sociais agregados. Nessa análise, a posição social do indivíduo define o voto, de forma que os eleitores advindos das classes mais altas da sociedade se identificariam predominantemente com as propostas de partidos e candidatos da direita do espectro político. (CERVI, 2012, p 97).

Ocorreu o mesmo com as classes médias e baixas, que deveriam ter identidade com os partidos e candidatos de centro e esquerda respectivamente. Na metodologia marxista de análise, a posição de classe e a condição econômica importam na definição do voto. Como as opiniões e os votos não surgem do nada e são individuais, o comportamento futuro dos indivíduos é função direta do grau de interação, da coerência de opinião e, consequentemente, o voto irá depender do nível de envolvimento dos eleitores. (CERVI, 2012, p 97).

A VOLATILIDADE ELEITORAL NO MUNICÍPIO DE ITABUNA – BAHIA

Por meio do cultivo do cacau, o sul do estado da Bahia, também chamado de região cacaueira, foi, até o final da década de 1980, uma terra próspera, compreendida por 41 municípios, com uma população estimada pelo IBGE (2017) em aproximadamente 1 milhão e 100 mil habitantes, com Itabuna sendo a principal cidade da região. Sua área territorial é de 401.028 Km², com população de 214.123 habitantes (IBGE/2021), sendo a 5ª maior cidade do estado. O Produto Interno Bruto – PIB per capta é de R$ 18.885,73, figurando na posição 2.938 de 5570, entre as cidades com maiores PIB’s do Brasil e o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal – IDHM é 0,712 (2010).

Nessa época, a cidade tinha em torno de 50 empresas de compra de cacau, entre multinacionais, nacionais/regionais e compradores avulsos, portanto, quase toda a movimentação de cacau da região passava pelo município, com direção ao porto de Ilhéus. A partir da década de 1990, com a infestação da lavoura pela praga Vassoura de Bruxa ou Crinipellis Perniciosa, que praticamente dizimou a lavoura cacaueira, a região passou a sofrer uma grave crise econômica, causando o aumento do desemprego, com alta migração populacional.

A cidade é cortada por duas rodovias federais, a BR 101 e a BR 415, que contribuem, pelo grande fluxo de veículos leves e pesados, para a melhoria do comércio e da prestação de serviços locais. Atualmente, é um grande polo educacional, com 2 grandes universidades, uma federal e outra estadual, 3 faculdades e vários polos educacionais, com oferta de quase 200 vagas por semestre, somente para o curso de medicina, além de uma unidade de escola militar.

A Lei Orçamentária Anual – LOA, de Itabuna, beira 1 bilhão de reais para o ano de 2023 e, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – CAGED, 20,40% da população ocupada, ou seja, 43.488 habitantes, tinham empregos formais em dezembro de 2020 (última atualização), se colocando na posição 19 de 417 municípios do estado. O salário médio mensal de pessoas ocupadas é de 1,9 salários mínimos, na posição 124 de 417 municípios. Em comparação com cidades de todo o país, ficou na posição 2.558 de 5770 e 1332 de 5570, respectivamente. Considerando residências com rendimentos mensais de até meio salário mínimo, 39% da população vivem nessas condições. A cidade está na posição 405 de 417 no estado e 2.870 de 5570, dentre as cidades do Brasil. Observa-se que só existem 12 cidades no estado da Bahia com percentual de residências, com ganho de até meio salário mínimo, maior que Itabuna.

A partir das eleições de 2012, com a nova estimativa populacional, obedecendo a Constituição Federal, o número de vagas na Câmara de Vereadores passou a ser de 21 assentos. Nas eleições de 2016 e 2020, a renovação da Câmara de Vereadores foi de 2/3 dos ocupantes, sendo que, em alguns casos, o vereador não concorreu à reeleição ou disputou outro cargo no município, como o de prefeito ou vice-prefeito.

Nas eleições de 2012, o legislativo municipal foi composto por eleitos de 16 partidos diferentes, sendo que o PT, PC do B, PPS, PTN e DEM, elegeram dois vereadores e PSC, PRP, PV, PRB, PSDB, PMDB, PSDC, PTB, PR, PMN, PRTB, com 1 vereador eleito. No contexto de gênero, ficou composto por 2 mulheres – 9,52% e 19 homens – 90,48%. O grau de instrução dos eleitos tinha 5 vereadores com nível superior, 12 vereadores com nível médio (completo ou incompleto) e 4 vereadores com nível fundamental (completo ou incompleto). Na composição dos profissionais com nível superior tinha 1 médico, 1 administrador, 1 odontólogo e 2 professores. Na página do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pesquisada não constava a etnia dos candidatos.

A composição do legislativo itabunense eleito nas eleições de 2016 se distribuiu em 15 partidos diferentes, separado da seguinte forma: PC do B, PHS, PSDB, PTC, PPS e PTB elegeram 2 vereadores cada e PR, PRB, PMN, PV, PT, PMDB, PRTB, PP e PDT elegeram 1 vereador. O quesito gênero se consolidou somente com 1 mulher, ou 4,76% e os homens com 20 eleitos, perfazendo 95,24%. O grau de instrução tinha 5 vereadores com nível superior, 12 com nível médio (completo ou incompleto) e 4 vereadores com nível fundamental (completo ou incompleto). Entre os profissionais com nível superior tinham 2 administradores, 1 contador, 1 empresário e 1 professor. No quesito etnia foram 6 vereadores declarados brancos, 14 pardos e 1 preto.

As eleições municipais de 2020 deixaram a Câmara de Vereadores de Itabuna com a seguinte divisão: o PL com 3 vereadores; PMN, PSD, PTC e Solidariedade com 2 vereadores; com 1 vereador PT, PC do B, Republicanos, Cidadania, Democracia Cristã, PSL, PP, PDT, PSB e Avante. Novamente 15 partidos distribuídos entre as 21 cadeiras do legislativo municipal. O item gênero ficou idêntico a eleição anterior. Em grau de instrução, são 3 vereadores com nível superior, 10 com nível médio (completo ou incompleto) e 8 com nível fundamental (completo ou incompleto). Os profissionais com nível superior são 1 advogado, 1 enfermeiro e 1 funcionário público municipal. Na página do Tribunal Superior Eleitoral pesquisada não constava a etnia dos candidatos.

CARACTERÍSTICAS POLÍTICAS DE ITABUNA

A política de Itabuna tem características singulares. A região cacaueira, berço dos coronéis do cacau, não deixou herdeiros políticos, e o tradicionalismo familiar, peculiar das elites dominantes, não deixou raízes na região. Um fato relevante, nesse contexto de volatilidade eleitoral do município de Itabuna, é que desde que foi instituída a reeleição, a partir das eleições de 1998, nenhum prefeito foi reeleito, seja por derrota ou por não concorrer ao pleito seguinte, de forma que nem mesmo a polarização vivida de janeiro de 1989 a dezembro de 2008, com Fernando Gomes e Geraldo Simões alternando 5 mandatos, alterou o cenário político da cidade. Podemos tratar desse assunto como um fenômeno político natural como também podemos admitir uma espécie de punição que o eleitor exerce sobre seus políticos na intimidade do exercício do voto.

A fragmentação partidária, que é peculiar ao nosso sistema político, se expressou cristalinamente nas eleições objeto dessa pesquisa e, é a principal causa da ingovernabilidade encontrada em algumas administrações, assim, devemos pontuar sobre a predominância do personalismo político em detrimento do partidarismo, fato encontrado com alto índice nessa pesquisa. Salvo poucas exceções, a quantidade de candidatos nas disputas em epígrafe, por partidos diferentes, atinge média acima de 2/3 dos concorrentes e significa que o partidarismo é pouco utilizado pelo eleitor no momento de decisão, prevalecendo o personalismo político, ou seja, a figura do candidato tem maior relevância.

Mesmo assim, nesse período com três eleições, somente dois candidatos foram eleitos em todas elas, principalmente por terem bases eleitorais fortes e imutáveis. Já os dois vereadores mais bem votados nas eleições de 2012 e 2016 não se reelegeram na eleição seguinte. Nas eleições de 2020, foram 11 candidaturas para o executivo municipal e o prefeito eleito teve 39,50% dos votos válidos. Da mesma forma, desde as eleições legislativas de 2010, Itabuna não elege nenhum deputado, seja estadual ou federal. Os últimos eleitos foram para o período 2007/2010.

Nas análises sobre as elites políticas, ficou demonstrado que não há nenhum grupo – familiar, religioso ou empresarial – com destaque no cenário político do município. Há pouca representatividade feminina e não há representantes das minorias étnicas, sociais ou de gênero.

Nas teorias para escolha do voto, a sociológica e a psicossocial tiveram menos impacto que a teoria da escolha racional, ficando nítido que o custo benefício do voto é utilizado com muito mais frequência pela população local. Segundo Arquer (2015) “o índice de volatilidade é o resultado de um mercado eleitoral, com ofertas e demandas” e destaca, “a alta fragmentação partidária e o baixo enraizamento das legendas, o motivo da dificuldade dos partidos políticos de conquistarem um eleitorado mais fiel”.

Uma das causas mais frequentes da volatilidade eleitoral encontrada no município, é o assistencialismo prestado por alguns candidatos, principalmente líderes comunitários, em que eleição após eleição uns aumentam exponencialmente sua votação e outros que, naturalmente diminuem a votação da eleição anterior. É como se o voto fosse um uma espécie de ressarcimento. Voto dado, dívida paga.

 Nesse cenário, também foram encontrados casos de candidatos, com nicho de eleitores mais politizados, que perderam, as vezes pela metade, parte do eleitorado conseguido em eleições anteriores. Observamos também que, por ser ume eleição proporcional, com alta fragmentação partidária, o coeficiente eleitoral teve grande relevância, com destaque para as eleições de 2020, quando o terceiro colocado geral, com 1450 votos, ficou com a primeira suplência e quinquagésimo primeiro colocado foi eleito com 569 votos.

Para efeito de comparação, Chapecó, cidade do oeste do Estado de Santa Catarina, com população de 227.587 habitantes, com 21 assentos na Câmara de Vereadores, similar a Itabuna (IBGE 2020), tinha na mesma data 104.568 habitantes, ou seja, 46,70 % da população com empregos formais e a LOA para 2023 é de quase 2 bilhões de reais.

O contraponto se deve a similaridades, como população e a quantidade de cadeiras na Câmara de Vereadores, mas também para demonstrar que a volatilidade eleitoral nos municípios da região nordeste é maior que nos municípios da região sul, como dito por Arquer (2015). Tais acareações serviram para manifestar que o fator de maior relevância é o econômico, como citado no corpo desse trabalho. Para 2023, Itabuna tem 50% do orçamento, com relação à cidade comparada. O município de Santa Catarina tem mais que o dobro de pessoas empregadas formalmente. Como último dado pesquisado, Itabuna teve 514 candidaturas a vereador em 2020, registrados no TSE. De acordo com a população, o equivalente a 1 candidato a cada 416 habitantes. Chapecó teve 280 candidaturas a vereador, registrados no mesmo tribunal, o equivalente a 1 candidato a cada 800 habitantes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desta forma, inferimos que as circunstâncias desfavoráveis que Itabuna tem passado, nos últimos anos, encontra no fator econômico o elemento preponderante para que o cenário político local viva em constante mutação. Há um vácuo de líderes, o que faculta o surgimento de atores políticos periféricos e desagrupados. O sufrágio universal é o direito de votar e ser votado, mas também é a oportunidade de fazer as escolhas certas, porque o voto é um poder-dever e é pessoal, mas as consequências dele são coletivas.

Urge, portanto, a necessidade de que representantes da sociedade civil, das entidades de classe, das universidades, dos partidos políticos, das igrejas, dos sindicatos, etc., se reúnam e tomem a iniciativa de discutir o futuro da cidade, com o objetivo de traçar projetos de políticas públicas que garanta o futuro das próximas gerações. É importante que a sociedade, como um todo, esteja engajada, com objetivos comuns. Essa sintonia é necessária para que sejam eleitas as prioridades da administração local, como a formulação e o diagnóstico das atividades de políticas públicas a serem implementadas para que possam abrandar as agruras da sociedade.

José Cássio Varjão – Cientista Político e Membro da Academia Brasileira de Ciência Política.

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