Começou a XXII Copa do Mundo de Futebol, nesta ocasião, no Catar. Pela primeira vez realizada num país árabe, o evento ocorrerá entre novembro e dezembro, mês diferente das outras copas, por questões climáticas, em razão do ambiente desértico, com expectativa de temperatura de até 30° celsius.
O Brasil de Pelé, Gerson, Rivellino e cia, foi o campeão da nona edição da Copa do Mundo de Futebol, realizada no México em 1970. Nessa época, com Emílio Garrastazu Médici na presidência da república, a ditadura militar tinha seu período mais repressivo, “os anos de chumbo” e a vitória em terras mexicanas serviu como instrumento de estímulo ao patriotismo alardeado pelos militares e presenteou a ditadura com a uma taça. Por ter sido o primeiro país tricampeão do mundo, pelo regulamento da FIFA, o Brasil ficou com a posse definitiva da Taça Jules Rimet, uma estatueta com 3,8 kgs de ouro maciço. “O futebol é o ópio do povo e o narcotráfico da mídia”. Vaticinou Millor Fernandes (1923-2012).
Obedecendo a alternância entre os continentes Americano e Europeu, para realização do torneio de futebol mais importante do mundo, a copa anterior tinha sido realizada na Alemanha Ocidental (1974) e a posterior seria realizada na Espanha (1982). A décima primeira Copa do Mundo de Futebol foi realizada na Argentina em 1978. Também vivendo sob regime ditatorial e tendo como espelho a vitória do Brasil em 1970, os militares argentinos, comandados pelo presidente da república, Jorge Rafael Videla, também sabiam o que deveriam fazer, e vencer a Copa do Mundo era questão de Estado.
Num dos escândalos mais grotescos da história das copas, o dia 21 de junho de 1978 ficou marcado por uma das maiores polêmicas já vista em um jogo de futebol numa copa do mundo. Argentina e Peru se enfrentariam em Rosário, no mesmo horário, 16h45, que Brasil e Polônia jogariam em Mendoza, mas a comissão organizadora alterou o horário do jogo dos anfitriões, para depois do jogo do Brasil, de forma que saberiam por quantos gols deveriam ganhar do Peru. O goleiro da seleção peruana era Ramón Quiroga, argentino naturalizado peruano, e ficou marcado como o vilão daquele jogo, em que a Argentina venceu por 6 a 0. Em 1998, vinte anos depois, em entrevistas ao jornal “La Nación”, Quiroga afirmou “que coisas raras aconteceram antes do jogo, como a visita de Videla e militares argentinos à concentração do Peru”.
De Leônidas da Silva até os dias atuais, passando por Zizinho, Pelé, Garrincha, Romário e Ronaldo, a época de copa do mundo coloca milhões de técnicos de futebol em campo, com escalações, comentários e críticas, cada um com uma opinião diferente. A maioria desses milhões de brasileiros que se arvoravam em discussões país afora, tinham, desde os primórdios da nossa história como país do futebol, um companheiro inseparável, com tamanhos variados, à pilha ou a energia elétrica e que tinha uma única obrigação: passar o dia todo funcionando, ligado, enchendo os seus usuários de informações. Era o aparelho de rádio.
Desta feita, além dos já nominados experts em futebol, teremos também a companhia de comentaristas, especialistas e toda espécie de conhecedor dos meandros da política, afinal, pela primeira vez teremos numa mesma época os dois assuntos em evidência. Em comum, no futebol e na política, existe o torcedor e o eleitor, a arquibancada e a rua, aquilo que chega ao nosso conhecimento e o que deve ficar à sombra, o que devemos acreditar e o que vendemos como verdade, os nossos princípios e o vale tudo.
O grande diferencial entre esses dois verbetes é que o futebol que nos unia, em época de Copa do Mundo, foi separado pela política. Éramos todos verde e amarelo, mas fomos divididos entre nós e eles, o bem e o mal, o nordestino e o sudestino, os patriotas e os comunistas, a raça ariana tupiniquim e as outras raças, os que estão inseridos e os que estão à margem da sociedade, os invisíveis.
No futebol, os pitacos sobre escalações, modelos táticos e etc perdem a essência quando o técnico da Seleção Brasileira, coloca os onze dele em campo. Na política, as discussões sobre ideologia de gênero, banheiro unissex, mamadeira de pi**ca, propagação de fake news e outras barbaridades, que intoxicaram a população durante o período eleitoral, ficaram no passado. Entra em campo agora a conversa de gente grande, a economia e todo o poder do capital.
“Enquanto os cães ladram, a caravana passa”. Tal provérbio árabe expressa o comportamento de algumas pessoas que ficam presas a determinada situação, delineando um espaço racional e limitado, enquanto o seguimento que os controla segue sua ordem natural, continuando firmes rumo ao seu objetivo final, policiando tudo e todos.
“Você pode dizer que sou um sonhador, mas eu não sou o único. Eu espero que algum dia você se junte a nós, e o mundo será um só”. Nas palavras de John Lennon, na canção IMAGINE, de 1971, o artista imaginou um mundo sem fronteiras, onde todos fossem iguais, eliminando o comportamento egoísta das pessoas, indo de encontro ao extremismo religioso e a xenofobia.
“I Have a Dream” – “Eu Tenho um Sonho”, foi o célebre discurso de Martin Luther King Jr, realizado em 28 de agosto de 1963 nos degraus do Lincoln Memorial, em Washington DC, quando o ativista falou “sobre a necessidade de união e coexistência harmoniosa entre brancos e negros”. Martin Luther King foi nomeado o Homem do Ano 1963, da Revista Time, e em 1964, se tornou a pessoa mais nova a receber o Prêmio Nobel da Paz. O pastor batista foi assassinado em 1968, em Memphis, Tennessee.
Antes deles, Rosa Parks, ativista negra estadunidense, símbolo do movimento dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos, ficou famosa no dia 1º de dezembro de 1955, em Montgomery, no estado do Alabama, por se recusar a ceder o seu lugar num ônibus a um cidadão branco. Sua atitude foi o estopim de um movimento que boicotou os ônibus de Montgomery, marcando o início da luta antissegregacionista nos EUA. Rosa Parks recebeu nas mãos do presidente Bill Clinton, em 1996, a Medalha Presidencial da Liberdade, a maior condecoração civil dos Estados Unidos.
Esse movimento anarquista que vivemos no Brasil de 2022, principalmente no pós-eleição, através do fenômeno político chamado bolsonarismo, que poderíamos denominar também de Neointegralismo ou Integralismo 2.0, por ter raízes no movimento conservador dos anos 1930, já utilizava como ideologia a defesa do patriotismo, do conservadorismo, do anticomunismo e de elementos fascistas. Atualmente incorporou o autoritarismo, o militarismo, o negacionismo científico, a defesa do uso de armas de fogo e a rejeição aos direitos humanos, pelas mãos do atual presidente da república, nos leva, em pleno século XXI, em direção contrária ao legado deixado por Lennon, King Jr e Parks.
Nessa data que se comemora o dia da Consciência Negra, 67 anos após o gesto de Rosa Parks, temos a certeza que vivemos num país escravocrata, atado às correntes que prendiam os escravizados no século XXVIII. Racista, porque a carne mais barata do mercado ainda é carne preta, favelada, que vive à margem da sociedade branca que desde 1500 dita as cartas por essas bandas do Continente Americano. E gol9pista, porque sempre, quando lhe é conveniente, desrespeita as regras do jogo democrático. Uma sociedade que também ficou conhecida por fazer leis que não eram cumpridas ou leis para inglês ver.