A CPI da Pandemia foi instaurada a mando do ministro Luís Barroso em 8 de abril para apurar as atuações do Governo Federal para a contenção do vírus, após o segundo surto ocorrido no Estado do Amazonas em janeiro de 2021 (o primeiro havia ocorrido entre abril e maio do ano passado) em que na metade do mês já haviam sido registrados mais de 6 mil mortes.
O fato que levou o magistrado a ordenar a abrir a CPI foi a abertura de igrejas e a permissão de de realização de missas. O pedido de uma CPI foi feito pelos parlamentares Jorge Kajuru (Cidadania-GO) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Segundo Barroso, em justificativa da sua decisão, ele disse que: “Trata-se de garantia que decorre da cláusula do Estado Democrático de Direito e que viabiliza às minorias parlamentares o exercício da oposição democrática. Tanto é assim que o quórum é de um terço dos membros da casa legislativa, e não de maioria. Por esse motivo, a sua efetividade não pode estar condicionada à vontade parlamentar predominante”, e complementou dizendo que: “Coerente com a minha visão de institucionalidade da Corte, tinha a intenção de submetê-la em mesa ao Plenário, na data de hoje. Infelizmente, a relevância e a extensão do julgamento relativo ao decreto restritivo de cultos religiosos durante a pandemia impediram que o fizesse. Observo, porém, que se trata, como demonstrado adiante, de mera reiteração de jurisprudência antiga e pacífica do Tribunal.”. Após a notificação, a CPI foi aberta (mesmo com muitas queixas dos aliados do governo, os quais tentaram impor todos os empecilhos para que a investigação não ocorresse, inclusive, o deputado Flávio Bolsonaro dizendo que a abertura da CPI causaria aglomeração.
Explicada esta primeira parte, foram convocados para prestar depoimentos na CPI: os 3 ex-ministros da saúde: Mandetta, Teich, o general Pazuello (o qual alegou primeiramente que teve contato com pessoas infectadas e que portanto, não seria possível o seu comparecimento na data marcada, e por último, requereu ao Supremo o direito de ficar em silêncio no seu depoimento), e também o atual Ministro da Saúde, além de outros ministros de outras pastas assim como ex-secretários do governo entre outras figuras ilustres que atuaram nesta pandemia. E é aqui onde começamos de fato a dizer acerca das peculiaridades desta CPI.
Na quarta-feira passada, o ex-secretário de Comunicação da Presidência da República, Fabio Wajngarten, foi convocado por conta da sua entrevista concedida à revista Veja, cuja declaração disse que, o que houve para o fracasso para o enfrentamento da pandemia foi a incompetência do Governo Federal. No entanto, diversamente do que havia declarado na sua entrevista, ele negou ter dito que o governo foi incompetente, todavia, o áudio da entrevista gravado pela revista comprova que de fato o ex-secretário falou em incompetência. Após a negativa, o senador, Renan Calheiros, relator da CPI (depois de muitas controvérsias) requereu ao presidente da CPI que desse voz de prisão, uma vez que a declaração dada era nitidamente mentira, ou, pelo menos, contraditória, o que foi prontamente negado por este, dizendo que: “Não sou carcereiro de ninguém”, e completou: “Vossa excelência tinha falado comigo sobre a questão da prisão e eu decidi que não ia fazê-lo, e vossas excelências insistiram com isso. Eu não sou idiota”.
Hoje, o ex-ministro das relações exteriores, Ernesto Araujo, cuja demissão ocorreu em março após sofrer várias pressões. Durante o seu depoimento, ele foi questionado acerca dos constantes embates e declarações ofensivas do Ministério das Relações Exteriores com a China e o quanto estas ações impactaram os atrasos na liberação de insumos para vacinas provenientes deste, o ex-ministro disse que não entendeu suas declarações como “antichinesas”. O presidente da comissão, neste instante, relembrou ao ex-chanceler de que ele estava ali sob como testemunha juramentada, e de que o seu discurso não condizia com a verdade, uma vez que, diversas vezes o próprio Araujo postou diversas ofensas ao país asiático, contudo, novamente Aziz deixou passar e não prendeu em flagrante o depoente.
Analisando os fatos, aqui teremos possivelmente o acometimento de dois crimes: o primeiro sendo de falso testemunho, e outro ao que tange a condução do próprio presidente da comissão. Vamos primeiro ao crime de falso testemunho que está no artigo 342 do Código Penal: “Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral”. Até aí tudo bem, mas pode-se perguntar: mas CPI não é administrativo? Verdade, porém, no artigo 58, §3º da Constituição diz que: “As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.”, ou seja, equiparou a CPI com a investigação criminal. Como o crime é cometido ao fazer uma falsa afirmação, considera-se que é possível uma prisão em flagrante conforme o artigo 301 do Código de Processo Penal. Ou seja, o depoente pode, se quiser, se recusar a responder a alguma pergunta, porém, jamais mentir, afinal, é o princípio “nemo tenetur se detegere”, ou, ninguém pode produzir provas contra si mesmo contido no inciso LXIII, artigo 5º da Constituição (e vamos relembrar do do que está sendo o caso do Pazuello).
Agora, falarei um que passou em branco para muita gente, que talvez o Omar Aziz também tenha cometido crime! Sim! O artigo 319 do Código Penal, que versa sobre o crime de prevaricação, descreve que: “Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. Na Administração Pública, não é facultado o gestor público fazer ou não dependendo da sua vontade, o servidor público (e estou falando em sentido amplo), tem o dever de fazer cumprir a lei, não lhe dando outra alternativa. Em ambos os momentos Aziz se recusou ou deixou de cumprir a lei, o que é um ato criminoso tanto quanto mentir numa investigação.
Continuaremos a acompanhar o desenvolvimento das investigações e analisar o que o governo esteve omitindo e mentindo durante este colapso da pandemia.